O
Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela assumiu nesta quinta-feira (30) as
competências do Parlamento, de ampla maioria opositora e ao qual considera em
desacato, em uma decisão que representa uma escalada na dura luta de poderes
deste país.
"Adverte-se
que, enquanto persistir a situação de desacato e de invalidade das atuações da
Assembleia Nacional, esta Sala Constitucional garantirá que as competências
parlamentares sejam exercidas diretamente por esta sala ou pelo órgão de que
ela disponha para velar pelo Estado de Direito", assinala a decisão do
Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) publicada na noite de quarta-feira.
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O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, apresenta o relatório anual
de governo ao TSJ
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O
TSJ, acusado pela oposição de servir ao governo de Nicolás Maduro, declarou o
Legislativo em desacato no início de 2016, devido à juramentação de três
deputados opositores cuja eleição foi suspensa por suposta fraude eleitoral.
Também anulou todas as decisões da entidade.
Embora
a Câmara tenha desincorporado estes parlamentares posteriormente, o Tribunal
considera que o ato não foi formalizado.
A
oposição, que controla a Assembleia Nacional, convocou manifestações de rua
para este sábado (1º).
"Esperamos
que o povo nos acompanhe. Sabemos que há medo e repressão, mas este é o momento
para nos levantarmos. A Venezuela tem fome de comida, justiça e
liberdade", declarou o presidente da Assembleia, Julio Borges.
A
nova decisão judicial da Sala Constitucional do TSJ ocorreu um dia após o
próprio tribunal retirar o foro dos deputados, utilizando como
alegação o desacato, o que abre a possibilidade de processá-los, inclusive ante
tribunais militares.
Isso
enquanto o Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) se
reunia para debater a grave crise política e econômica do país petrolífero. O
encontro em Washington terminou sem acordo, mas 20 países assinaram uma
declaração conjunta na qual expressam "preocupação pela difícil situação
política, econômica, social e humanitária" da Venezuela.
A
bancada opositora aprovou no dia 21 de março um acordo no qual pediu à OEA que
aplique a Carta Democrática Interamericana, que prevê sanções em caso de
alterações ou ruptura do marco constitucional, o que foi classificado por
Maduro como "traição à pátria", um crime punido com penas de até 30
anos de prisão.
REAÇÕES
Em
protesto às ações do governo venezuelano, a Chancelaria do Peru anunciou a
"retirada de maneira definitiva" de seu embaixador em Caracas. O
presidente peruano, Pedro Pablo Kuczynski, afirmou que "a América Latina é
democrática. É inaceitável o que está acontecendo na Venezuela".
A
ministra de Relações Exteriores venezuelana, Delcy Rodríguez, afirmou que
"rechaça o apoio grosseiro do governo peruano aos setores violentos e
extremistas da Venezuela" e cita um "plano da direita na região para
atacar o sistema democrático venezuelano".
A
OEA (Organização dos Estados Americanos) acusou Maduro de dar um
"autogolpe". "As sentenças da Suprema Corte são os últimos
golpes com os quais o regime subverte a ordem constitucional do país e acaba
com a democracia", disse o secretário-geral Luis Almagro. "Aquilo que
vinhamos advertindo infelizmente se concretizou."
Almagro
convocou ainda uma reunião de emergência do Conselho Permanente da OEA.
Em
nota, o Itamaraty "repudia a sentença do TSJ" e a classifica como
"claro rompimento da ordem constitucional". "O pleno respeito ao
princípio da independência dos Poderes é elemento essencial à democracia. As
decisões do TSJ violam esse princípio e alimentam a radicalização política no
país", diz o documento.
O
Brasil afirma, porém, que "a responsabilidade primária de inverter o rumo
da crise cabe hoje ao próprio governo venezuelano".
O
chanceler do México, Luis Videgaray, reagiu se dizendo "gravemente
preocupado" pelo que considera "uma deterioração da ordem democrática
na Venezuela".
O
ministro de Relações Exteriores do Chile, Heraldo Muñoz, também manifestou
preocupação "ante o agravamento da crise política na Venezuela".
O
ex-presidente chileno Sebastián Piñera, candidato à Presidência nas eleições de
novembro, invocou a cláusula democrática da OEA. "O Chile e todos os
democratas devemos defender a liberdade e a democracia na Venezuela, invocando
a cláusula democrática da OEA."
A
chanceler da Colômbia, María Ángela Holguín, afirmou a jornalistas que expressa
"profunda preocupação pela decisão do Tribunal Supremo" e pediu o
"respeito à separação dos poderes".
O
ex-presidente e hoje senador colombiano Álvaro Uribe pediu a prisão de Maduro
pelo que considera "uma nova etapa do golpe de Estado" na Venezuela.
ESCALADA
Para
analistas como Benigno Alarcón, a escalada vivida pelo forte conflito de
poderes existente na Venezuela é uma resposta às recentes ações da OEA.
"O
governo está tentando aumentar a pressão sobre os parlamentares e a comunidade
internacional, dizendo que está disposto a represálias e a prender líderes
opositores que estejam buscando ajuda no exterior", disse Alarcón à AFP.
A
sentença que aponta que o TSJ assume as funções do Parlamento foi produzida em
resposta a um recurso de interpretação sobre a Lei Orgânica de Hidrocarbonetos.
A
lei indica que o governo, para constituir empresas mistas no setor petrolífero,
precisa "da aprovação prévia" do Parlamento. No entanto, ao declarar
"omissão legislativa", o TSJ indicou que não existe "impedimento
algum" para que o Executivo as crie sem passar pelos deputados.
As
gestões na OEA são promovidas pelo secretário-geral da organização, Luis
Almagro, que exige a convocação de eleições gerais em curto prazo e a
libertação de uma centena de opositores presos.
As
eleições presidenciais estão previstas para dezembro de 2018, enquanto as
regiões deveriam ter ocorrido no fim do ano passado, mas o poder eleitoral as
adiou para 2017 e ainda não fixou uma data



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